Por que eu chorei assistindo a "Tudo bem no natal que vem"

Julia Drummond
3 min readDec 18, 2020

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(Pode conter spoilers)

Eu li em alguns posts no Facebook que o especial de natal da Netflix estrelando o Leandro Hassum nos faria chorar. Fiquei curiosa e decidi assistir.

É como disseram: você não espera que uma comédia mais ou menos do Leandro Hassum te faça chorar. Primeiro porque a comédia do Leandro não funciona mais, pelo menos pra mim. Na época do "Nós na fita" quem sabe (aliás, reassisti e percebi que envelheceu muito mal, nossa). Mas hoje ele faz umas piadinhas muito tiozão, e nem zoando tiozão ele consegue ser engraçado.

Mas sim, o final mexeu comigo. A fórmula a gente já conhece: é tipo Click, só que a reflexão sobre a vida surge a partir de uma tragédia que atinge não o protagonista, mas sua filha, que morre de câncer de mama.

E aí você deve estar se perguntando: por que um filme que reproduz vários clichês de família nuclear heteronormativa mexe tanto com alguém?

No meu caso, porque mexeu com as minhas memórias de natal.

A essa altura da vida, apesar de eu ainda ter 28 anos, eu sinto falta de muita gente que se foi e de muitas coisas que não acontecem mais. Eu sempre amei o natal quando era criança, porque pude ganhar muitos presentes, porque tinha comidas que no resto do ano não eram comuns e porque eu via muita gente que eu amava junto.

Eu me lembro de ver parentes que vinham uma vez por ano ao Rio, de ir ao shopping (criança criada em apartamento ama qualquer desculpa pra sair de casa), de ficar com a minha vó Nelminha quando passávamos o natal na casa dela. Eu tive todos os meus avós vivos até 2006.

Hoje, nesse ano de pandemia em que está todo mundo isolado (mais ou menos, né), eu olho pra trás e fico feliz pelas lembranças, mas triste por pensar que, se eu tivesse o poder de escolha, teria escolhido algumas coisas diferentes.

Existem coisas que não dependem da gente, nem quando a gente vira adulto, tipo a vida dos nossos avós ou as relações que outras pessoas que amamos decidiram manter, como nossos pais ou mesmo nossos primos e primas.

Eu ainda amo o natal porque eu descobri ao longo dos anos que essas desculpas pra fazer a gente parar um pouco e celebrar são essenciais no modo de vida em que vivemos. Se a gente não parar por um dia que seja pra cantar parabéns, visitar a nossa mãe ou comer salpicão com os nossos avós, quando vamos fazer isso?

Eu sei que existem diversos arranjos familiares, incluindo pessoas que acham que convivem até demais com certos parentes.

Mas, no meu caso, morando sozinha em outro estado há algum tempo, essas datas são muito importantes. E esse filme me fez sentir saudade dos natais com muita gente, daquele calor do caralho que faz no Rio nessa época (só gringo pra enfiar papai noel na nossa goela), do cheiro de bolinho de bacalhau sendo frito e até das piadas ruins. E me faz chorar pelas coisas que eu gostaria que voltassem mas que, infelizmente, não dependem de um simples pedido.

O filme não é uma obra prima do cinema. Mas, por se passar no Rio, de onde eu sou, pelos detalhes da direção de arte (rabanada, pernil, pavê) e por nos fazer acreditar nos 30 minutos finais que algo poderia ser diferente, me fez chorar.

E agora tudo o que eu quero é abraçar os meus avós.

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Julia Drummond

Feminista, negra, advogada, mestre em Direitos Humanos pela USP. Gosto um pouco de scifi, dar pitaco em séries, aulas de dança de clipe e vídeos de gatinhos.